Algumas considerações sobre a proposta do Orçamento de Estado 2025

15 de novembro de 2024 por
Ordem dos Biólogos, Secretariado
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Uma análise, ainda que breve, da proposta de Orçamento do Estado (OE) para 2025, em discussão na Assembleia da República, em especial nas matérias que mais diretamente importam aos Biólogos, leva-nos a concluir que várias das matérias que têm sido discutidas com os serviços e as tutelas estão longe de estar contempladas. Por outro lado, algumas matérias que têm sido anunciadas pelo Governo e que surgem aqui como “ambição estratégica”, não estão quantificadas e carecem de especificação. Vamos centrar-nos apenas em duas áreas governamentais: A Saúde e o Ambiente e Clima.

Saúde


Destas destacamos, pela sua relevância e impacto na vida dos Biólogos que exercem a sua atividade profissional na área da saúde humana, a ausência de qualquer referência à revisão da carreira dos Técnicos Superior de Saúde, com a criação do ramo de Biólogo Clínico, ou a criação de uma carreira própria de Biólogo Clínico. Por outras palavras, não será em 2025 que este assunto terá desenvolvimentos significativos.

Nos capítulos do OE onde são abordadas medidas e políticas de SAÚDE, são referidos três grupos profissionais a valorizar em 2025: Enfermeiros, Médicos e Farmacêuticos. Os Biólogos, assim como os restantes profissionais especialistas integrados na carreira dos Técnicos Superiores de Saúde ficam, uma vez mais, fora das medidas previstas para 2025.

É que muito para além da valorização do estatuto remuneratório, no caso dos Biólogos, importa criar uma carreira de Biólogo Clínico que permita não só dignificar, mas também valorizar técnica e cientificamente o seu trabalho em áreas cruciais, como a genética humana, a embriologia e reprodução medicamente assistida e as análises clínicas.

Numa área científica onde o conhecimento e a tecnologia estão em constante e acelerada evolução, é realmente inqualificável e inaceitável que a carreira de Técnico Superior de Saúde não seja revista desde o final dos anos 90 do século passado. Ao que acresce, que os últimos estágios profissionalizantes de acesso à carreira tenham ocorrido em 2002 e/ou 2005 (em função da área de especialidade).

A esmagadora maioria dos profissionais que opera nas áreas referidas são Biólogos e Bioquímicos (também eles representados pela Ordem dos Biólogos).

Não é possível manter os laboratórios de Estado e os hospitais em funcionamento sem assegurar a componente técnico-científica, essencial para a qualidade e eficácia dos serviços prestados.

Da mesma forma, não será possível implementar algumas das medidas propostas pelo Governo sem a participação dos Biólogos Clínicos, de que são exemplo:

Alargar a capacidade de resposta dos Centros de Procriação Medicamente assistida, com alargamento da capacidade dos bancos de gâmetas, aumento da comparticipação dos medicamentos e melhoria do acesso. (Plano Plurianual de Investimentos, pág. 273).

Porque sem Biólogos (muitas vezes designados nesta área de embriologistas) não há Procriação Medicamente assistida! O trabalho destes profissionais é fundamental para garantir a qualidade e o sucesso dos processos de procriação medicamente assistida, desde a seleção e manipulação de gâmetas até a monitorização e acompanhamento das técnicas de fertilização, assegurando a segurança e a eficácia dos tratamentos. E não será possível implementar a Estratégia Nacional para a Medicina Genómica, compromisso assumido pelo Governo Português ao assinar a declaração «Towards access to at least 1 million sequenced genomes (1+MG) in the European Union by 2022», e a Ação para as Doenças Raras 2025-2023, uma vez que, mais uma vez, os Biologos Clínicos são a grande maioria dos profissionais a desempenhar funções nos laboratórios de genética médica/genética humana no SNS.

Do mesmo modo, será também difícil assegurar, com sucesso, a Residência Farmacêutica na área da Genética Humana, pois são os Biólogos especialistas em Genética Humana, que, na grande maioria dos serviços de genética médica/laboratórios de genética humana do SNS, estão a assegurar a sua formação. Matéria que levanta uma outra questão, essa de equidade: com a anunciada valorização remuneratória da carreira Farmacêutica, passaremos a ter, lado a lado nos laboratórios, técnicos especialistas a desempenhar as mesmas funções com diferentes remunerações, que não resultam das suas melhores competências e anos de serviço, mas sim de um mero ato administrativo que favorece uns em detrimento de outros.

Em conclusão, é urgente e justo consagrar a revisão da carreira dos Técnicos Superior de Saúde, com a inclusão do ramo de Biológico Clínico, ou a criação da carreira de Biólogo Clínico (que engloba Biólogos e Bioquímicos) no Orçamento de Estado de 2025.

Ambiente e Energia


Em matéria de Ambiente e Energia, destacamos algumas das dúvidas que as medidas do OE2025 nos suscitam:

  • A gestão sustentável da água é identificada (e bem) como uma grande prioridade estratégica, mas não estão contemplados medidas e incentivos à redução de consumo nem à procura e implementação de soluções de adaptação às alterações climáticas, com menor dependência de água. Também não estão contempladas medidas de promoção e incentivo à reutilização de águas residuais.
  • Por outro lado, o OE2025 inscreve a reabilitação de linhas de água e a remoção de barreiras obsoletas nos rios como prioridade e indica que serão objeto de novos investimentos. Sendo louvável em abstrato esta medida, não estão identificadas ações que conduzam ao bom estado ecológico das massas de água, como estabelecido pela DQA, nem que ao restabelecimento da conectividade hídrica dos rios portugueses, ou o desmantelamento de barragens e açudes obsoletos.
  • No domínio do restauro ecológico e da proteção de biodiversidade, salienta-se pela positiva a elaboração do Plano Nacional de Restauro Ecológico, não obstante não é clara a participação dos “vários setores da sociedade” invocada no OE quando confrontamos com o Despacho nº 12734/2024, nem a abrangência do que se pretende envolver.
  • Relativamente à gestão das áreas Protegidas o governo propõe-se aplicar a Lei aprovada na AR na última legislatura sobre esta matéria, por proposta do PSD, com especial destaque para o retorno de Diretores de AP procurando devolver uma gestão de proximidade a estes territórios especiais:

Em 2025 voltarão a existir diretores, equipas técnicas e vigilantes alocados à sua gestão efetiva. Com esta mudança, as reservas e parques naturais deixam de ser geridos à distância por departamentos regionais e passam a ter equipas permanentemente no terreno e em proximidade aos problemas locais de conservação da natureza. Numa primeira fase, também para avaliar o impacto da alteração, o novo regime será aplicado a cinco áreas protegidas, uma em cada região do continente.

Falta, no entanto, clarificar que recursos vão ter os Diretores, como será a articulação entre estes e as Comissões de Cogestão, os órgãos regionais e a direção nacional do ICNF. Também não é explicito que recursos humanos serão melhorados para permitir esta “maior proximidade”.

O Ambiente e Energia refere que “será dada especial atenção às áreas marinhas protegidas, considerando a necessidade de criar condições para uma governança mais efetiva e articulada…” Mas o OE2025 não identifica como e com que meios será implementada esta Governança efetiva. O tempo urge, os compromissos nacionais para as Metas 2030 são claros e conhecidos de todos, e seria fundamental que este assunto fosse explícito no OE.

Ainda no que concerne à Conservação da Natureza, a conclusão e publicação dos Planos de Gestão das Zonas Especiais de Conservação é uma medida urgente, que peca por tardia pois deveria estar concluída há pelo menos cinco anos, e que por isso tem hoje elevadíssimo custo para o erário público e o bolso dos portugueses por incumprimento da transposição da Diretiva Comunitária sobre a matéria, cuja conclusão e custos associados deveria estar inscrito neste OE.

O desafio que deixamos ao Governo é que no próximo Orçamento de Estado quantifique as “Imparidade de inventários e ativos biológicos (perdas/reversões)”. Essa é a verdadeira forma de valorar o capital natural do nosso país, e de sabermos quanto vale e quais os custos que deveremos afetar à sua preservação.

A Bastonária da Ordem dos Biólogos

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